quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Virá o dia...


Virá o dia em que ninguém se lembrará do bater ininterrupto da água sobre os guarda-chuvas, abafando o barulho das lágrimas e as ladainhas do padre. Conforta-os talvez, um pensamento animista há muito perdido na infância, no qual o universo sente a mesma dor, e , por solidariedade, chora também… A chuva cai e dilui a dor, torna-a difusa, pelo menos a quem assiste. Ao bater dos sinos, o universo cala-se e diminui o choro; fecham-se os guarda-chuvas a medo e um sentimento de comunhão envolve a multidão: sim, vamos lavar as lágrimas nesta chuva miudinha, partilhar o pão e o vinho deste sacrifício colectivo. Ilusão infantil que depressa se desfaz aos primeiros indícios de temporal… Não podia ter vindo em melhor hora, abafa o baque definitivo da terra a cair sobre o caixão e os gritos daqueles que vêem parte de si caída por terra. Pai, afasta de mim aquele cálice, e fujo de mansinho por entre a confusão. O ribombar de uma mota acorda em mim a vergonha do meu gesto… Virá o dia em que não poderei fugir nem esconder-me da morte. Sim… Virá. Mas não hoje.

quarta-feira, 21 de março de 2012

É que nem se tentasse muito!

Às vezes pergunto-me se a relutância perante certas coisas básicas, como tomar banho de chuveiro, lavar a cabeça e trocar de roupa frequentemente, é uma característica dos velhos em geral (e portanto, algo que estará também no nosso futuro distante), ou se simplesmente chamamos "básicas" a coisas que grande parte da vida deles chamaram de "luxos".

Vai daí procuro ter paciência e repetir pela milésima vez que não avó, não se pode limpar a farrapos quando vai à casa de banho, que sim avó, tem sempre de colocar a fralda completa na hora de ir dormir, por precaução, e que não avó, não pode mesmo dormir com a fralda por cima das cuecas (!!!).

Achava que coisas desse tipo já não me conseguiam surpreender... Até que hoje ouvi uma história que nem que tentasse muito conseguiria imaginar! Então não é que uma das irmãs da minha avó, contam as filhas, quando ia à casa de banho, depois de se limpar com o papel higiénico, o punha religiosamente a secar para voltar a usar?!

Aiai... Será isto o que nos espera?

sexta-feira, 16 de março de 2012

Da língua antiga: cómodo

Porque eu uso como sinónimo de confortável, e a avó S. como divisão da casa, quis saber a opinião do dicionário da priberam online:

cómodo

adj.

1. Que se presta ao uso a que é destinado.INCÓMODO
2. Que não causa desgosto.
3. Em que não se sentem privações.
4. Que agrada ou causa bem-estar. = AGRADÁVELDESAGRADÁVEL, INCÓMODO
s. m.
5. Qualidade do que é cómodo. = COMODIDADE
6. O que é cómodo. = COMODIDADE
7. Emprego, ocupação.
8. Cada uma das divisões de uma casa.
9. Quarto; aposento.
10. Casa em que se serve.
11. Utilidade, proveito.
12. Agasalho, hospitalidade.
preço cómodopreço razoável.

Dez reis de nada

Porque não costumo usar essa expressão e não quero perdê-la. Porque tenho curiosidade de saber de onde vem. E porque nessa procura encontrei outra semelhante:

Réis é o nome dado aos múltiplos do antigo Real Português (também conhecido por réil), moeda que circulou na Dinastia de Avis.
Essas moedas circularam em Portugal durante todo o período entre Dom João IV e Dom Manuel II, só sendo substituídas pelo Escudo e seus Centavos no surgimento da República Portuguesa.

10 réis - um centavo - Uma moeda que chegou a valer alguma coisa lá pelo século XVII, mas que também só servia para troco, a ponto de se ter o ditado "Quem nasce para 10 réis nunca chega a Vintém".

"Merreis": 1.000 réis - Rs. 1$000 – 1 Escudo ou 1 Cruzeiro Antigo - Valor que é considerado como a verdadeira base do padrão "réis", uma vez que era o valor mais fácil de contabilizar. Também conhecidos por mé-réis.

Ps: esta informação foi tirada da disciclopedia, que não encontrei mais nada sobre o assunto, pelo que a sua veracidade é altamente questionável. ;p

Agridoce

Às vezes fico a olhar para ti de respiração suspensa, na esperança de captar com a memória aquele instante, e de um dia mais tarde  carregar no play e vivê-lo de novo... Sinto-me feliz por estares aqui comigo.  Mas também sinto um misto de alegria e de tristeza ao calçar-te as meias: apetecia-me carregar no play, voltar atrás, a um morno anoitecer de verão, a uns pés que não são estes, a óleo de amêndoas doces sem carapins.

quinta-feira, 1 de março de 2012

On my own...

Desde sempre me questionei como é que com o tempo algumas pessoas ficam iguais aos seus progenitores, ainda que tenham passado a vida toda a criticar esses mesmos defeitos... E finalmente percebi como: acontece sem  darem conta. Continuo é sem perceber porquê...

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Memória vs realidade: a gripe asiática de 1957

"No dia 9 de Agosto de 1957, o navio Moçambique, proveniente de África, entra na barra do Tejo para atracar no porto de Lisboa. Traz a bordo passageiros doentes. Naquele dia, a epidemia de gripe acabara de ser importada. Provocada por um novo vírus que anteriormente não tinha circulado em Portugal, encontrou a população de Lisboa e do País inteiramente desprotegida.

Investigações epidemiológicas, conduzidas pelos especialistas da Delegação de Saúde de Lisboa, identificaram os primeiros casos. Verificaram que uma criança de onze anos de idade, que se deslocara com a família ao cais para acolher o avô que viajara no Moçambique, adoecera a 11 de Agosto. Nos três
dias seguintes, todos os membros da família adoeceram igualmente. Por outro lado, mulher e filhos do médico assistente, que residia no mesmo prédio do bairro de Alvalade, também adquiriram gripe.

A partir do final de Setembro, a gripe assume expressão epidémica. Meses antes, em Fevereiro desse ano, no Norte da China, tinha tido início a pandemia de gripe “Asiática” no seguimento da emergência de novo subtipo A H2N2 que passou a infectar seres humanos. Compreende-se que, no plano psicossocial, a descrição dos fenómenos e as imagens da pandemia de 1917 tenham provocado grande preocupação.

Lisboa em plena epidemia de gripe “asiática” era, seguramente, uma cidade diferente, sobretudo na primeira e segunda semanas de Outubro. Absentismo nas empresas, fábricas paralisadas, transportes públicos com problemas de funcionamento, escolas fechadas, postos dos serviços médico-sociais da Federação das Caixas de Previdência com um aumento extraordinário de procura, hospitais sobrelotados, visitas suspensas à Maternidade Dr. Alfredo da Costa, e, logo depois, medida idêntica adoptada nos Hospitais Civis de Lisboa.

Em meados de Outubro, as notícias continuam a reforçar o “carácter benigno” da gripe em Portugal. Em contrapartida, era anunciada “a epidemia de gripe com muita gravidade em cidades como Paris, Londres, Zurique, Bruxelas, Viena de Áustria e na União Soviética”.

Os números oficiais e os estudos realizados contradizem essa benignidade.Mas o contexto social explica a forma como a gripe foi vivida no País."

Francisco George
Belmira Rodrigues
Mário Carreira

Para saber mais:

http://www.dgs.pt/upload/membro.id/ficheiros/i010472.pdf